E o Facebook?

O caso da utilização de dados do Facebook para campanhas políticas desenvolvidas pela Cambridge Analytica veio colocar em cima da mesa a forma como a rede se comporta com os utilizadores.

Por Manuel Falcão, director-geral da Nova Expressão – Planemaneto de Media e Publicidade

O modelo de negócio do Facebook, e de grande parte das empresas digitais, baseia-se na gratuitidade dos serviços, em troca do acesso a informação dos utilizadores. Quando nos registamos numa rede damos Ok a contratos, na esmagadora maioria dos casos sem lermos o seu conteúdo. Mas, mais do que dizer o nosso sexo ou idade, estamos a dar autorização para que a nossa actividade seja rastreada e seguida. Os dados que se tornam valiosos, e que no caso foram utilizados pela Cambridge Analytica, não são os dados de registo mas os da nossa actividade ao longo dos tempos – por onde andámos, que pessoas seguimos, onde colocamos likes, os interesses que pesquisamos. São esses dados que, analisados de forma automatizada, permitem dizer que determinada pessoa pode estar receptiva a receber uma mensagem. O custo da nossa utilização do Facebook é este: abrirmos a nossa vida e deixarmos que quem quiser possa passear por ela.

Mais: nos últimos dias soube-se que o Facebook rastreia as conversas dos utilizadores no Messenger, e daí extrairá mais dados. Vem a talhe de foice dizer que o Facebook é dono do Instagram e do WhatsApp e obviamente tem dados destes utilizadores. Já agora, muitas outras aplicações que hoje temos nos nossos smartphones proporcionam um grau semelhante de informação sobre nós – desde a localização geográfica por onde andamos, até as buscas que efectuamos ou os nossos hábitos de compra online. A conjugação de dados de várias destas aplicações, tema relativamente fácil de concretizar, permite traçar o que é um dia na vida de cada um de nós – como navegamos, o que fazemos quando estamos na net, quais os nossos percursos habituais enquanto consumidores digitais. No ponto a que as coisas chegaram, com a navegação na internet a ser já feita maioritariamente a partir de smartphones, a realidade é que a maior parte do que fazemos é utilizável a nível comercial. Este é o preço que pagamos ao utilizar aplicações gratuitas (e, às vezes, até as pagas). O que podemos fazer para o evitar? Deixar de ter vida digital? Não parece que seja uma opção realista.

A solução tem que passar por alguma regulação e vigilância mais apertada na utilização de dados. Mas isso vai abrir gigantescas polémicas. Quem fala em ameaças à liberdade neste contexto deve ter presente que a ameaça vem dos gestos de cada um e da forma como aceitámos abrir a nossa vida a olhares de terceiros, como nunca antes.

QUAL O FUTURO DOS CARROS AUTÓNOMOS?

O recente acidente ocorrido nos EUA com um veículo autónomo da Uber, e que resultou num atropelamento mortal, veio abrir um debate sobre o futuro dos veículos auto-conduzidos. O que podemos perceber é que o acidente veio atrasar os planos mais ambiciosos e que a indústria ainda vai ter muito que aperfeiçoar. Mas voltemos atrás – nos últimos cinco anos os carros auto-conduzidos passaram de “uma ideia possível” a “algo concretizável” e nalguns casos a “um avanço inevitável”. Todos os grandes fabricantes estão a investir no tema e procuram passar a fornecedores de soluções de mobilidade – e este caminho provavelmente já não tem volta. Para além da Google, pioneira com a sua Waymo, a Lyft e a Uber estão no terreno, assim como a Tesla, a Volvo ou a Mercedes. Gigantes tecnológicos como a IBM ou a Apple procuram forma de ter parte do bolo de negócio que se avizinha. Mas regressemos à questão: quando é que os carros de condução autónoma se tornarão comuns? Esta é a forma errada de fazer a pergunta. O veículo autónomo não pode ser encarado como uma máquina que um dia fica pronta e começa a ser distribuída – trata-se de um sistema, de um conjunto de descobertas e inovações. A pergunta mais importante nesta matéria é: como é que toda a tecnologia que permite os carros autónomos vai mudar a nossa vida? De tantas formas que ainda não imaginamos, desde deslocações de rotina até a entregas de encomendas. Uma coisa é certa: os transportes de pessoas e bens e o conceito actual de mobilidade e utilização de veículos mudarão na próxima década. O acidente ocorrido não impede o desenvolvimento da tecnologia, vai obrigá-la a ser ainda mais sofisticada.

Este artigo foi publicado na edição de Abril de 2018 da revista Executive Digest.

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