O que eu quero ser quando for grande!
As conversas entre crianças e adultossão quase sempre parvas e não é por culpa das crianças, como é óbvio! Uma, porque as crianças não têm a desenvoltura necessária para exprimir opiniões ou pensamentos fundamentados sobre a maioria dos assuntos, com excepção de guloseimas e brinquedos (e vai daí, o mesmo se poderia dizer sobre alguns dos nossos gestores, políticos e afins, mas aí nem as guloseimas nem os brinquedos escapariam). E duas, porque os adultos a deveriam ter!
Há dois clássicos nas conversas entre adultos e crianças, a par de todas as outras pérolas, que marcam a infância da maioria das pessoas: um é o tradicional (e absurdo!) “gostas mais do paizinho ou da mãezinha?” e o outro é o não menos notável “o que é que queres ser quando fores grande?”. Sem dúvida igualmente cretinas, ambas as perguntas obrigam a criança a manifestar opiniões que genericamente resumem a origem dos problemas da maioria dos adultos (Freud explica)!
A lógica que subjaz às opiniões de uma criança é, naturalmente, muito mais pragmática e linear (com o passar dos anos vamos perdendo a objectividade e a inocência). “Quando for grande quero ser bombeiro para andar depressa! Quero ser médico para poder “dar picas” aos outros! Ou quero ser advogado para ganhar muito dinheiro (hoje em dia, e devido à popularidade dos estabelecimentos de fast food e à realidade do nosso país, também é provável que digam que querem ser advogados para poderem trabalhar no McDonald’s)”. Por norma as meninas querem ser bailarinas o que, convenhamos, é compreensível, dado que esta é a única altura na vida de uma mulher em que usar roupa justa e corde- rosa e uma saia que deixa tudo à mostra não parece mal! Ou professoras, também querem ser professoras, mas isso, lá está, é fruto da abençoada ignorância de tão tenra idade que as impede de saber o estado do ensino em Portugal e que as “dádivas” do ensino hoje em dia só são apelativas para quem goste de apanhar pancada (quem disse que o sadomasoquismo estava demodé?)!
Uma coisa é certa, da forma como as coisas andam, o mais provável é as crianças de hoje em dia perspectivarem “fazer carreira” do subsídio de desemprego quando “forem grandes” (os menos ambiciosos provavelmente contentarse- ão com o rendimento mínimo). E pensar que nenhum de nós, em criança e mesmo já adulto, poderia sequer imaginar (tirando a Maya talvez) que o que o futuro lhe reservava era a “empresa moderna” e o “Estado em liquidação total”. Não há por onde escapar! Por um lado temos o empregador moderno que, quando contrata, pede experiência comprovada de pelo menos 5 anos, fluência em várias línguas, pós-graduações e especializações em áreas altamente técnicas e oferece um generoso ordenado de 500 Euros e trabalho que daria para pelo menos cinco pessoas fazerem! Por outro, temos o (des)Governo com as suas medidas para estabilizar e crescer, que se traduzem em endossar a factura aos contribuintes e basicamente desestabilizar por completo as finanças dos trabalhadores e diminuir os seus “dinheiros” (honestamente “rendimentos” é demasiado insultuoso dado que pressupõe que efectivamente alguma coisa… renda).
Mas pessimismos para quê? Temos um Estado radical, que possibilita aos seus cidadãos emoções fortes e constantes! Adrenalina! Viver no fio da navalha! Para além da educação, da saúde, das obras públicas e tudo o mais também se paga para trabalhar neste país… este poço não tem fundo realmente!
O que é que eu quero ser quando for grande? Ah! Quando eu for grande!
Por Isolda Brasil