Randstad Insight: O talento está na estratégia da empresa

Por: José Miguel Leonardo
CEO
Randstad Portugal

O talento é uma das palavras mais utilizadas nos últimos anos e tem vindo a integrar o léxico de quase todas as empresas, em especial na área dos recursos humanos.

Na Randstad não contrariámos esta moda, na verdade o nosso foco no talento já tem mais tempo e assumimos o mesmo de forma transversal e não como algo exclusivo de uma área de competência. Procuramos talentos para os nossos clientes, mas também para nós enquanto empresa. Abraçámos este conceito não apenas no momento da atracção e do recrutamento, mas também como parte integrante da nossa estratégia de gestão de pessoas. Este processo na nossa empresa foi feito de forma natural porque somos uma empresa de recursos humanos, focados nas pessoas, mas esta mudança não foi igual em todas as organizações.

Hoje encontramos empresas que alteraram as suas estruturas e terminaram com a expressão “recursos humanos” para se focarem em exclusivo na gestão de talento. Uma mudança de nomenclatura que não pode ser apenas uma alteração de palavras, porque a gestão de talento não é sinónimo de recursos humanos. Não querendo entrar em grandes dissertações académicas, vale a pena recuperar o conceito de gestão de talento da Universidade John Hopkins que o define como um conjunto de práticas integradas de recursos humanos desenhadas para atrair, desenvolver, motivar e reter colaboradores produtivos e engaged.

Com esta base é fácil compreender que este conceito não esvazia o papel dos recursos humanos, mas é uma parte importante na realidade das organizações. A gestão de talento tem influência e impacta nos processos mais tradicionais de recursos humanos porque implica uma visão holística da estratégia de contratar, formar e reter colaboradores de topo. A empresa não está apenas focada em si, mas sim passa a centrar a sua estratégia na pessoa e define um conjunto de acções e interacções que são transversais a toda a organização. A proposta de valor (EVP – employee value proposition) definida pela organização está directamente relacionada com a forma como é gerido o talento e as estratégias de employer branding também.

Esta componente organizacional parece um tema exclusivo de recursos humanos, mas na verdade é um tema de gestão. O coração da empresa, a forma como esta está organizada vai contribuir para desenvolver os seus talentos e ao mesmo tempo retê-los. A sua satisfação e engagement vão contribuir para que eles sejam promotores da empresa enquanto entidade empregadora, vai criar employee advocacy positiva, o que hoje sabemos que tem um impacto substancialmente maior do que qualquer campanha de marketing. Este foco na estrutura e na gestão de pessoas vai permitir às empresas serem competitivas na arena do talento e discutirem frente a frente com outras na contratação de perfis de referência, sem que o salário seja o factor principal.

O talento deve ser usado, considerado e implicar transformações na nossa organização interna. O talento não é um tema de recursos humanos, mas sim algo estratégico e fundamental para o sucesso das empresas e que deve estar interligado com a sua estratégia e modelo de gestão. Na guerra pelo talento, as empresas têm de ter a sua unique selling proposition, que será o seu EVP e terão que reconhecer a importância dos seus colaboradores para serem atractivas.

Assegurar e reter talento

As pessoas são o principal factor que faz a ligação entre inovação, competitividade e crescimento nas empresas actuais. mas assegurar o talento de topo está a tornar-se um objectivo mais complexo e difícil, com as empresas norte-americanas a citarem esse factor como a maior ameaça para cumprir os seus objectivos.

Um inquérito a mais de 2000 líderes realizado pela Randstad, o Workplace Trends Guide de 2016 oferece uma visão dos desafios específicos do talento e do seu impacto nas receitas e informações. As provas são claras. A necessidade de talento superior está a aumentar e as organizações reconhecem que vale a pena lutar pelos melhores. Enquanto os líderes de engenharia norte-americanos sentem o aumento da pressão competitiva por causa da globalização, da inovação digital e do abrandamento do crescimento, também indicam o fornecimento desadequado de talento qualificado e apto como a segunda maior ameaça.

O ESTADO DO SECTOR DA ENGENHARIA

Muitas facetas do sector da engenharia têm sofrido embates nos últimos anos, em parte graças a mercados externos mais fracos, um mercado de petróleo e gás instável e uma conjuntura empresarial em transformação. O resultado é um abrandamento geral no sector. Mas, o sector da engenharia é abrangente e diversificado e quando analisamos sectores específicos – principalmente os que são estimulados pela inovação – o futuro parece promissor.

Os engenheiros devem perfazer 14,4% de todo o crescimento de emprego nas ciências e engenharia (C&E) nos EUA de 2012 a 2022, o que demonstra uma pequena diminuição de 1% na percentagem projectada do sector do emprego nas C&E ao longo da década.

UM NOVO CONJUNTO DE DESAFIOS

À medida que o sector da engenharia tenta capitalizar as oportunidades de crescimento estimuladas pela inovação e tecnologias emergentes, a capacidade de empregar talento de topo na engenharia para estimular essas iniciativas determinará o sucesso ou fracasso de uma empresa.

Entretanto, o Workplace Trends Study da Randstad descobriu que ainda há muitos desafios antigos para quem contrata engenheiros: altas taxas de rotatividade; desafios envolvendo a eficácia do recrutamento; dificuldade em contratar o talento certo.

A procura de engenheiros qualificados está a aumentar, mas encontrar talento de topo continua a ser um desafio para muitas organizações. Graças a uma força de trabalho envelhecida na engenharia e menos alunos de engenharia em certos sectores, a necessidade de talento irá aumentar à medida que o sector recupera.

FALTA DE APTIDÕES E TALENTO

A maioria dos líderes de engenharia tem dificuldade em encontrar o talento mais adequado com as aptidões certas. E esta dificuldade é muito maior do que encontrar colaboradores que encaixem na cultura organizacional.

90% revelam que é importante contratar candidatos com experiência. Apesar disso, esta é uma área onde aparentemente há mais falta de candidatos a empregos.

VAGAS: O QUE É DEMASIADO TEMPO?

O tempo que demora a preencher vagas na engenharia está a aumentar, deixando muitas em aberto durante meses. Em média, os líderes reportam que têm 15% menos pessoal do que deveriam e cerca de 60 posições em aberto. Adicionalmente, é preciso em média 110 dias para recrutar e contratar posições não executivas. As vagas em aberto podem diminuir os lucros. As empresas perdem 450 euros/dia por cada vaga por preencher. Se a média de contratação na engenharia é de mais de 100 dias, o impacto nas receitas é indiscutível.

COMO RECRUTAR RECURSOS

Então, quais as estratégias que os líderes estão a usar para diminuírem o tempo que demora a encontrar talento e reduzir vagas? Os gestores de engenharia parecem estar a expandir os canais de recrutamento, com 54% a reportarem que usam fóruns de emprego, 49% empresas de recrutamento e 47% o LinkedIn. Além disso, quando tiveram de identificar o método mais eficaz, as empresas de recrutamento receberam a classificação mais alta. Muitas reconhecem o valor e a necessidade de colaborar com parceiros de recrutamento. Com a luta contínua pela eficiência, a flexibilidade é vital para manter a produtividade e diminuir o tempo que demora a encontrar talento de topo.

RIGOR NAS CONTRATAÇÕES

Assim que um bom candidato é identificado, como pode um gestor assegurar que um indivíduo será adequado para a equipa? Enquanto a avaliação de aptidões é um método provado para ajudar a verificar se um candidato é adequado, pouco mais de metade (56%) dos líderes de engenharia inquiridos revelaram que usam esses métodos. Para a maioria das empresas, o uso de avaliações de aptidões são essenciais para a contratação. À medida que os empregadores da área da engenharia continuam a lutar contra a rotatividade e vagas por preencher, não se podem dar ao luxo de adivinhar se o candidato a uma vaga irá cumprir as expectativas.

AGARREM-SE BEM PELA ROTATIVIDADE

O aumento das taxas de rotatividade continua a ser um problema para os responsáveis por contratar talento em engenharia. Não só os líderes estão mais preocupados com a rotatividade do que estavam o ano passado, como quase dois em cada cinco viram subidas na taxa de rotatividade em 2015. Num mercado laboral mais restrito, onde encontrar talento de topo é mais difícil, os líderes não se podem dar ao luxo de ver o talento sair porta fora.

PREPAREM-SE PARA A GUERRA SALARIAL

O efeito de um mercado laboral mais restrito significa que os executivos que estão a contratar engenheiros estarão à procura de talento de topo difícil de encontrar, mesmo que isso signifique afastá-los da concorrência. Eis uma das temáticas mais prementes que surgiu este ano – a pressão por ordenados e compensações competitivos está a crescer.

Os ordenados ajustados à inflação para o colaborador médio norte-americano mal se mexeram nos últimos cinco anos, aumentando apenas 2,2% ano após ano. Historicamente, quando o emprego está em alta como hoje, os salários crescem cerca de 3 a 3,5% ao ano. A falta de aumentos permitiu às empresas conterem custos e reaverem capital, mas aparentemente à custa de colaboradores desmotivados – provado pela alta taxa de rotatividade e as dificuldades no recrutamento. Apesar de haver outros aspectos que contribuem para uma maior retenção do talento de engenharia, a força do dólar não pode ser subestimada.

O DINHEIRO É IMPORTANTE

Mesmo com a baixa taxa de desemprego nos EUA e a boa criação de emprego, os salários entre as empresas inquiridas estagnaram no último ano. A tendência é que os colaboradores terão que abordar os níveis de compensação para o talento qualificado.

As pesquisas generalizadas sugerem que as empresas norte-americanas devem aumentar o salário-base, independentemente da função ou nível, numa média de 3% em 2016. Os profissionais experientes com aptidões específicas estão a exigir aumentos ainda mais altos, já que a procura ultrapassa a oferta em muitos sectores.

COLABORADORES MOTIVADOS

Embora a pesquisa continue a mostrar que a confiança dos colaboradores está mais alta agora do que nos últimos anos, é justo dizer que muitos colaboradores ainda estão a sentir a dor de uma recuperação económica lenta marcada por pouco ou nenhum crescimento salarial e custos de saúde cada vez mais altos. Apenas 22% dos norte-americanos afirmam que têm poupanças suficientes para pagar pelo menos seis meses de despesas.

Os recentes dados da Randstad revelam que 63% dos colaboradores, em diferentes sectores e indústrias, sentem que já deviam ter sido aumentados. Desde 2004 que as contribuições médias dos colaboradores para a cobertura médica da família aumentaram 81%. Como resultado, 44% dos colaboradores afirmam que usariam um cartão de crédito ou retirariam das poupanças para pagar despesas de um acidente ou doença grave.

Mais ansiedade financeira em cima dos colaboradores norte-americanos significa que os empregadores que descobrirem formas de recompensar os colaboradores terão uma vantagem distinta em comparação com as concorrentes. As melhorias salariais ajudam a encontrar o precioso talento e diminuem o custo da rotatividade para os colaboradores existentes que se sentem valorizados, recompensados e empenhados.

SABER PLANEAR A SUCESSÃO

Não surpreende que preencher posições de talento executivo e liderança seja o mais difícil para as empresas. É interessante, porém, que os líderes de negócios de vários sectores tenham nomeado a incerteza sobre a “liderança ou visão da empresa” como uma das principais preocupações que lhes tiram o sono. Como resultado, o planeamento da sucessão e o desenvolvimento da liderança da próxima geração serão prioritários em 2016 e mais ainda.

No ano passado, estima-se que mais de 3,6 milhões de Baby Boomers se devem ter reformado e mais de um quarto de millennials ascendeu a cargos de gestão. Apesar das preocupações por causa da falta de liderança, dois terços das empresas norte-americanas admitem que não têm plano de sucessão formal a ser cumprido. Num mercado laboral restrito, a falta de estratégia de sucessão deixa uma empresa vulnerável.

Os profissionais experientes, principalmente os que têm aptidões, são frequentemente abordados por outras empresas. Os que estão de saída levam com eles um manancial de conhecimento e experiência prática que demora tempo a recriar num novo candidato. Os programas de sucessão consistentes identificam e apoiam a próxima geração de gestores e líderes com “mentoring”, formação e missões diferentes, para que estejam prontos a pegar no leme quando chega a altura.

ADAPTAÇÃO A UM LOCAL MILENAR

Segundo os líderes de RH inquiridos, a ética de trabalho é a segunda área mais comum na qual os faltam candidatos, seguida de perto pela experiência prática relevante. O que leva a uma questão ainda mais abrangente – o fosso entre gerações.Em 2020, os millennials vão perfazer 50% da força de trabalho, e esse número atingirá provavelmente 75% em 2025. A maioria dos líderes empresariais concordaria que a entrada de millennials tem contribuído para alterações naquilo que consideramos um ambiente de trabalho típico.

Mas, embora seja mais importante compreender o indivíduo e não a geração, os gestores que têm noção das diferenças entre gerações e abraçam essas qualidade têm mais probabilidade de criar uma equipa empenhada.

À medida que muitos aspectos do local do trabalho estão a ser redefinidos, talvez esteja na altura de considerar que os millennials vêem a ética de trabalho de forma diferente. Muitos têm expectativas e desejos específicos sobre o local de trabalho. As empresas que o reconhecem e trabalham para abordar essas diferenças de forma positiva têm mais hipóteses de sucesso.

APROVEITAR A TECNOLOGIA

As empresas enfrentam diversos obstáculos quando desenvolvem equipas de sucesso, da competição à falta de talento qualificado e uma pressão maior para fazer mais com menos. Como tal, precisam de todas as vantagens para desenvolverem um forte canal de talento, reterem os colaboradores de topo e melhorarem o desempenho empresarial geral.

A disponibilidade cada vez maior e as capacidades das ferramentas digitais para a gestão de talento dão às equipas de RH a oportunidade para melhorarem o recrutamento e selecção, entre outros aspectos do ciclo de vida do emprego.

As empresas que se movem rapidamente para integrarem essas tecnologias e as usarem de forma estratégica aumentam as receitas e a produtividade até 9% e baixam os custos do talento e de RH até 7%, de acordo com um recente relatório do McKinsey Global Institute.

Mas as plataformas de recrutamento online estão também a dar uma nova mobilidade aos colaboradores – e a dar à concorrência novas ferramentas para atrair os melhores colaboradores. Para ganhar a guerra pelo talento, as empresas devem aproveitar as plataformas digitais para atraírem talento, mas devem manter um bom ambiente de trabalho de forma a reterem os colaboradores.

MELHORAR A EXPERIÊNCIA

À medida que a força de trabalho e o local de trabalho se desenvolvem, os líderes empresariais e as equipas de RH têm que ter estratégias sociais e digitais para atrair e recrutar talento de topo. Na era da informação, os possíveis colaboradores querem saber como é trabalhar para uma empresa e procuram empregadores com reputação positiva.

A revolução digital também aumentou a importância de um employer branding claro e convincente, que possa oferecer a vantagem necessária para ganhar a lealdade do melhor talento no mercado de trabalho. Enquanto os negócios há muito que usam o marketing e as práticas de branding para criarem a lealdade dos clientes, existe o desejo de espelhar esses esforços para diferenciar organizações e torná-las atractivas do ponto de vista do colaborador.

A maioria dos colaboradores norte-americanos escolhe “uma reputação como um bom local para trabalhar” como o factor mais importante ao considerarem um novo emprego. Contudo, apenas 32% das empresas inquiridas indicaram que possuem uma estratégia sólida de employer branding. Quase uma em cada cinco (18%) discutiram o employer branding e estão a trabalhar para desenvolver essa estratégia, mas ainda não está a ser usada.

As estratégias de employer branding não podem ser deixadas ao acaso. Em vez disso, exigem que haja um enfoque no desenvolvimento dos componentes centrais – factores como seja a cultura da empresa, a experiência/percepção do candidato e o empenho dos colaboradores.

UMA ABORDAGEM HOLÍSTICA

Este ano, os trabalhadores temporários – incluindo independentes, trabalho pontual e freelancers – vão perfazer quase 45% da força de trabalho total mundial. Calcula-se que mais de 40% da força de trabalho norte americana será temporária em 2020. O que significa isto? O segmento do trabalho temporário cresce em importância e tamanho.

Muitas empresas estão a concentrar-se em reunir pessoas, processos e tecnologias numa abordagem holística para acelerar o crescimento das suas capacidades. Uma perspectiva holística não vê o talento como permanente ou pontual. Vê os acordos laborais como tendo potencial para satisfazerem uma necessidade particular. Isto deixa a empresa aproveitar todos os recursos disponíveis para abordar uma necessidade sem as limitações de ter de aproveitar apenas um tipo de colaboradores.

Dos participantes no estudo Workplace Trends Study, 59% reportaram que a flexibilidade dos colaboradores temporários fez com que as suas organizações permanecessem ágeis durante altos e baixos económicos. Contudo, muitas vezes é preciso uma mudança interna significativa para adoptar essa abordagem. Estimular essa mudança exige consenso entre todos os stakeholders, incluindo RH, aquisições, contratações e líderes. Os obstáculos estruturais devem ser eliminados e deve ocorrer uma maior partilha de dados e informações para a circulação livre de talento.

Artigo publicado na edição de Fevereiro de 2017 da Executive Digest.

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