Como devolver o sorriso a Portugal

As empresas portuguesas têm problemas de produtividade e enfrentam a complexidade criada pelas leis. Falta valorizar as pequenas e médias empresas e projectar a imagem da qualidade dos produtos nacionais no estrangeiro. Ainda assim, existem razões para sorrir.

Foi este o mote da 4ª Conferência Marketeer, que teve lugar ontem no Museu do Oriente. Representantes de empresas de sucesso e do mundo da música, académicos e criativos juntaram-se para debater “Como devolver o sorriso a Portugal?”.

A crise do défice traz oportunidades, como a extinção de empresas estagnadas, dando espaço a outras com potencial de crescimento e que podem absorver o talento disponível. Esta foi uma das ideias apresentadas por Nadim Habib, administrador da Formação para Executivos e professor na Nova School of Business and Economics (Nova SBE), a quem coube a abertura da conferência.

Nadim Habib identificou problemas da economia portuguesa como a fraca produtividade em relação ao número de horas de trabalho: cada português trabalha mais horas do que um alemão mas é muito menos produtivo. O recurso sucessivo ao crédito tem vindo a equilibrar a falta de produtividade das empresas. Portugal, assim como Espanha e Grécia, tem falhas também ao nível da “gestão de topo”, considerou o orador, com uma enorme complexidade a dificultar o funcionamento das organizações, fruto do número de regras e leis “baseadas em evitar abusos”. A simplicidade é um conceito chave para solucionar esta questão e tem origem na pergunta “por que fazemos as coisas que fazemos?”. “Uma boa estratégia clarifica o que fazemos na organização”, reiterou o académico.

como-devolver-o-sorriso-a-portugaljpgNão obstante, existem motivos para sorrir “porque, pela primeira vez, temos de mudar” e há oportunidades para o fazer, defendeu. Empreender é uma oportunidade mas também uma necessidade, dado que “não vale a pena olhar para os Governos como criadores de emprego”. «A meritocracia está a chegar ao País. Vai ser doloroso, mas, pela primeira vez em 20 anos, quem trabalha e é positivo vai poder criar projectos excelentes», acrescentou o professor.

Portugal do Fado e das “pequenas coisas”
“Mais de metade das empresas do Fortune 500 foram criadas em alturas de dificuldade” e que cresceram rapidamente “quando os tempos melhoraram”, factos apontados por Vítor da Conceição Gonçalves professor catedrático do ISEG e pró-reitor da UTL. Ao seu lado no primeiro painel estiveram ainda Carlos Coelho, presidente da Ivity Brand Corp.; Guta Moura Guedes, co-fundadora da “Experimenta – Associação para a Promoção do Design e Cultura de Projecto”; e Miguel Stilwell de Andrade, administrador da EDP. O tema em destaque seguiu o mote da conferência.

Falta a Portugal reconhecer a sua dimensão e qualidade no exterior, lançou Carlos Coelho. O representante da Ivity defendeu que os portugueses “têm vergonha de falar sobre o País”, enquanto “o mundo já descobriu que o que é feito em Portugal é bom”.

Por sua vez, Guta Moura Guedes afirmou que a população já ultrapassou esse sentimento de inferioridade quando ao estigma de ser português. Nessa mudança, surgiram “novos actores” que conseguiram “ocupar espaço e ter voz”. Todavia, falta coragem para agir sob o “enorme potencial de desenvolvimento” do País e “rentabilizar o que nos torna únicos”, reiterou a co-fundadora da Experimenta.

A projecção de Portugal no exterior esteve em destaque. Miguel Stilwell de Andrade reiterou que as empresas “devem ser globais” e que “não têm de ter fronteiras”, defendendo que “a EDP continua a ser portuguesa” quando questionado sobre o investimento chinês da eléctrica. Guta Moura Guedes concordou com a ideia ao constatar que “é de reforçar a dimensão internacional e cosmopolita da nossa cultura”.

A tristeza e saudade tipicamente portuguesas são uma mais-valia, enquanto “motor de criação tão forte como a alegria”, acrescentou. Carlos Coelho adverte que “é preciso criar em Portugal a economia das pequenas coisas”, a par do orgulho se trabalhar numa PME e de valorizar os produtos nacionais. “Se é bom, tem de ser caro”.

A valorização do que é nacional foi uma ideia inevitavelmente recuperada no segundo painel da conferência, dado que este contou com a presença de João Roquette, CEO do Grupo Esporão; Jorge de Mello, administrador da Sovena; Luís Araújo; administrador do Grupo Pestana; Rui Paiva, CEO da WeDo Technologies; e Mariza, fadista e embaixadora do Fado – Património da Humanidade. Desta feita, os convidados discutiram “Como devolver o brilho a Portugal?”.

Representando os vinhos, os azeites, o turismo, a tecnologia e a cultura portugueses, os oradores abordaram a falta de notoriedade dos produtos nacionais. Este foi o facto que motivou o foco da estratégia da Sovena não no conceito da portugalidade, mas “na sua expertise” e em “marcar a diferença”, assegurou Jorge de Mello.

Mas Portugal tem de se assumir como “um país pequeno”, realçou João Roquette, valendo-se dos seus produtos de qualidade como o calçado e a gastronomia. “Não vale a pena jogar o mesmo jogo que os chineses e os indianos. Temos de colocar alma no que fazemos», acrescentou.

Alguns oradores convergiram na opinião de que não conseguiriam sobreviver sem a internacionalização das suas actividades. Rui Paiva reconheceu mesmo que o “ser português” não ajudou no caso da WeDo Technologies, sendo que Portugal não é visto como um País tecnológico. Pelo contrário, Mariza considerou que a língua não é uma “barreira”. O Fado “gera uma música tão válida como qualquer outra, em que a língua portuguesa pode ser ouvida e sentida”.

Por sua vez, Luís Araújo valorizou a “hospitalidade”, “receptividade” e “acolhimento” nacionais e a sua importância para a indústria hoteleira, relatando que o Grupo Pestana se posicionou “lá fora como um grupo português”.

O País tem razões para sorrir, apesar das dificuldades e do cenário de crise, concluíram os dois painéis.

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