Accenture Digital Business: Trends 2018 entre os dados e os algoritmos

Há novos desafios para as marcas, ditados pela tecnologia. Entre bots e o desenvolvimento da inteligência artificial, está toda uma mudança em curso. Estão as empresas preparadas?

Tendência – ESCRAVOS DO ALGORITMO

Estamos a ver um novo ambiente de marketing, que não é retalho online nem lojas físicas. Neste “terceiro espaço”, os algoritmos estão a ter o papel de guardiões entre consumidores e marcas, e estão indiferentes aos esforços de branding que influenciam a forma como as pessoas tomam decisões de compras. Como definiriam uma estratégia de marketing em que as pistas visuais e empáticas desaparecem?

O que se passa?

A transformação do marketing está a acelerar: a rápida evolução dos algoritmos orientados pelos dados, a evolução de assistentes digitais accionados por voz e a confiança crescente dos utilizadores em ambos. No início, os algoritmos orientados por dados foram criados para os utilizadores encontrarem com mais facilidade o que querem, o que lhes poupava tempo, dinheiro e, acima de tudo, espaço mental. Quanto mais dados o utilizador partilha, mais personalizados os resultados que obtém. Foi assim que o Spotify aprendeu a recomendar novos artistas e faixas, e a Netflix novos filmes e séries que os utilizadores adoram.

Recentemente, a utilização destes algoritmos expandiu-se para lá das recomendações, estimulando o desenvolvimento de uma vasta gama de propostas com IA.

Menos comuns são os bots criados por terceiros com o objectivo de ajudar ou tornar a vida do utilizador mais fácil. Exemplos incluem o DoNotPay, um “bot legal” que contesta as multas de estacionamento em prol do utilizador, e bancários como o Cleo, que afirma ser o Siri das finanças pessoais.

Depois temos os serviços de recomendação baseados em texto que ajudam os clientes a fazerem compras. Os primeiros exemplos incluem bots de mensagens de marcas como o da Sephora, que lançou a aplicação de mensagens Kik em 2016. Além de oferecer dicas de beleza personalizadas e recomendações e críticas, permite comprar produtos mencionados no seu chat – sem sair do Kik.

O aparecimento e a rápida evolução dos assistentes digitais com reconhecimento de voz (como o Alexa da Amazon e o Xiaowei da Tencent) transformaram a experiência de procurar recomendações de produtos – tornando-a mais imediata, envolvente e reactiva do que nos chats baseados em texto. E os clientes estão a abraçá-la mais depressa.

O desafio é este: quando um cliente for seduzido pela prontidão e diversão de interagir com o Alexa e não directamente com a marca, como irá reagir? O Alexa e os seus rivais têm predisposições integradas, por isso o essencial é encontrar formas de os contornar.

Na Primavera de 2017, previu-se que o número de utilizadores de assistentes accionados por voz – um mercado dominado pela Amazon, que terá uma quota de mercado de 70% – deverá chegar aos 130% no final do ano. E o mercado deve continuar a crescer, tendo em conta que 25% dos utilizadores usam- -nos para 11 ou mais tarefas.

Embora tenha demorado até os clientes se sentirem confortáveis com serviços que usam algoritmos, os níveis de confiança atingiram um ponto em que os clientes sentem que os podem usar para fazerem compras. Inevitavelmente, pouco tempo passou até as primeiras marcas fazerem parcerias com a Amazon para os clientes tratarem de encomendas através de um comando por voz no Alexa. Entre as pioneiras encontravam-se a cadeia de pizzas Domino’s e a cadeia britânica de supermercados online Ocado.

Os clientes demoraram a confiar nos algoritmos, mas temos provas de uma mudança na forma como descobrem e decidem o que comprar. Os clientes já estão a render-se aos algoritmos.Em 2018, espera-se que o mercado das compras feitas por assistentes de voz crie um “terceiro espaço” para retalhistas e marcas. Encaixado entre os outlets online e as lojas físicas, este mercado irá ser impulsionado por algoritmos e não pelas buscas tradicionais, onde os clientes farão muitas compras sem sequer verem primeiro os produtos.

O que se segue?

Os sinais dos mercados já nos indicam que, à medida que os assistentes baseados em algoritmos se desenvolvem e prosperam, tornar-se-ão importantes canais de venda. Enquanto a aprendizagem das máquinas que estimula estes algoritmos continua a desenvolver-se, surgirão serviços mais personalizados e baseados em preferências.

Os algoritmos guardiões irão tornar a vida dos clientes mais fácil, mas terão de compreender a diferença entre serviços de self-service criados para servir os principais interesses de uma marca e outros criados para benefício do cliente. À medida que os clientes distinguem entre estes dois tipos de serviço, irão escolher os que melhor satisfazem as suas necessidades e em quais confiam.

Algumas organizações serão capazes de criar algoritmos guardiões e o seu sucesso dependerá de compreenderem o que grupos de clientes valorizam e o que querem mais desses serviços. Outras organizações, porém, irão descobrir que alguns algoritmos guardiões têm poder para limitarem o seu acesso directo aos clientes.

Há a forte possibilidade de vermos em breve um algoritmo dessensibilizado algures entre uma organização e os seus clientes – que não note coisas como o esforço de branding visual, o apoio de celebridades ou as campanhas de publicidade. Como seres empáticos, as pessoas são influenciadas por isto, mas os algoritmos não. O que causa um possível problema: se o guardião entre uma marca e os seus clientes não está susceptível aos esforços necessários para atrair os clientes, como irão as marcas ligar-se aos consumidores?

Depois entra a predisposição. Quando um cliente escolhe um assistente digital numa plataforma em particular, irá ficar preso numa relação com os parceiros dessa plataforma, criando obstáculos a concorrentes. Essencialmente, os lares irão transformar-se em lojas sem embalagens e etiquetas, tornando obsoletas as estratégias tradicionais das retalhistas para chamar a atenção. Isto terá várias implicações para as marcas e para as retalhistas.

O Alexa da Amazon já tem mais probabilidade de recomendar produtos Amazon Prime para quem faz encomendas pela primeira vez. O que faz com que seja mais difícil para as outras marcas terem os seus produtos incluídos nos resultados da pesquisa do Alexa.

Os algoritmos que indicam recomendações funcionam melhor quando não são demasiado formais nem inovadores. Tendem a explorar preferências conhecidas em vez de encorajarem os utilizadores a procurarem opções. As marcas novas ou menos conhecidas encontrarão aqui um obstáculo para que os seus esforços ganhem velocidade.

No próximo ano, as marcas de bens embalados e as retalhistas terão de aprender a navegar num ambiente em que os comportamentos dos consumidores anteriormente fiáveis serão eliminados ou muito reduzidos, e os objectivos habituais de marketing como obter quota de mercado tornar-se-ão um desafio ainda maior.

Tendência – À PROCURA DE SIGNIFICADO

Enquanto a “ameaça” aos empregos era a introdução de linhas de produção, de máquinas de escrever ou de veículos motorizados, o tópico em destaque hoje é a ascensão da inteligência artificial e dos robôs. As organizações têm de parar de falar no assunto e começar a criar com esta mudança em mente.

O que se passa?

Os primeiros dias da IA estavam intrinsecamente ligados aos robôs, mas a ascensão do digital – e do software e das redes que a sustentam – dissociaram a IA da robótica e expandiram o seu alcance a uma gama maior de máquinas.

As máquinas já conseguem fazer muito do nosso trabalho pesado e, cada vez que o fazem, tornam-se mais inteligentes. Há pouco tempo, o trabalho manual parecia estar mais perigo com a IA, mas a sua capacidade crescente pode fazer com que intervenha em muitos empregos que envolvem conhecimentos. Na China, por exemplo, um dentista robótico completou recentemente a sua primeira cirurgia de implantes independente num paciente.

Além disso, cada vez se torna mais notório que as máquinas se estão a tornar, segundo Paige Maguire, designer da Fjord, «outro tipo de utilizador» – um colaborador ou colega. Muitos estão obcecados com os empregos que serão tornados obsoletos com a IA e a aprendizagem das máquinas, mas a sua preocupação está incorrecta.

É verdade que as máquinas têm substituído os humanos em empregos que envolvem tarefas repetitivas em ambientes estáveis, e continuarão a fazê-lo. Contudo, agora que as máquinas guiadas pela IA conseguem tomar decisões e podem fazer tudo, de detectar e escolher apenas maçãs maduras a conduzir um carro, elas irão invadir um conjunto mais diversificado de profissões.

Crucialmente, porém, o debate está a afastar-se dos empregos que irão desaparecer e a passar para as novas e inovadoras formas de colaboração entre pessoas e máquinas.

Uma equipa de Harvard concebeu recentemente um método de IA que consegue identificar células cancerígenas com 92% de precisão. Na sua experiência, os patologistas ultrapassaram as máquinas com uma precisão de 96%. Todavia, quando juntaram forças, os patologistas humanos e a IA identificaram 99,5% de biopsias cancerígenas, mostrando como IA e pessoas chegam mais longe quando colaboram.

A Google está a usar a IA em combinação com analistas para identificar e remover conteúdos controversos no YouTube. Um benefício da colaboração é a redução da exposição de conteúdos gráficos a analistas humanos.

No início de 2018, os drones deverão entregar vacinas na remota ilha nação de Vanuatu como parte de uma parceria entre o governo do ilha e a UNICEF, para oferecer uma ajuda prática aos prestadores de cuidados de saúde no terreno. Também os robôs humanóides Pepper e Nao, criados pela empresa japonesa Softbank Robotics, foram experimentados em dois jardins-de-infância de Singapura. Os robôs ajudaram os professores ao fazerem às crianças perguntas sobre uma história que haviam acabado de ouvir, incitando-as a escolherem respostas. Mais uma vez, a ideia é complementar, não substituir.

A introdução de máquinas nem sempre significará menos empregos – apenas empregos diferentes. Os corretores financeiros passam 90% do seu tempo a processar aplicações. Essas tarefas são ideais para serem feitas pela IA, que libertaria os corretores para se focarem em casos ambíguos e para passarem mais tempo a interagirem com pessoas e não com ecrãs.

Num recente estudo global, a Accenture identificou novas categorias de empregos – Formadores, Explicadores e Suportes – onde os humanos complementarão as tarefas levadas a cabo pela tecnologia cognitiva, criada pela ascensão das máquinas com IA.

Depois de adquirir a empresa de robótica Kiva por 655 milhões de euros, a Amazon emprega agora mais de 45 mil robôs – e continua a recrutar e a empregar pessoas.

O que se segue?

Precisamos de repensar a forma como máquinas e pessoas coexistem, e conceber formas de as ajudar a obter o melhor.

Para evitar o que alguns chamam de “apocalipse dos robôs”, as organizações devem reunir a criatividade humana, a inteligência e um optimismo para reinventarem novas formas de as máquinas ampliarem as nossas próprias capacidades humanas.

Podemos ter sucesso se desenvolvermos interacções apropriadas entre pessoas e máquinas que sejam suficientemente poderosas. A BMW está a dar o exemplo. Um dos seus últimos carros conceito foi criado para mitigar a falta de comunicação nos veículos autónomos ao desenvolver uma pseudo-relação entre o carro e passageiro para que este se sinta seguro ao ser conduzido por uma máquina.

O design terá um papel central para as organizações que queiram criar soluções que permitem às pessoas ficarem mais à vontade com a inclusão de IA no local de trabalho. Os designers ajudarão as organizações a identificarem como precisam de se desenvolver, para criarem experiências, produtos e serviços para o novo mundo que se avizinha. Também irão ajudar a redefinir a natureza da experiência de trabalho e desenvolver uma nova geração de produtos e serviços – alguns automatizados, outros colaborativos – para aproveitar os pontos fortes de humanos e máquinas.

Seguindo em frente, as organizações devem aprofundar os seus conhecimentos sobre IA, analisar e abordar algumas da questões mais profundas e optimizar as estratégias em conformidade. Agora têm de fazer perguntas importantes como: como iremos interagir com as máquinas; como iremos aprender a trabalhar com elas; como elas irão aprender connosco; e como podemos criar comunicações bilaterais?

Quando mais humanas e sociais tornamos estas interacções, mais complexidade e flexibilidade acrescentamos – não é um desafio trivial. As máquinas precisam de aprender o uso inconsistente da linguagem dos humanos e a forma como juntamos palavras e gestos, e terão de interpretar e reproduzir uma etiqueta nova. As organizações têm de refazer a sua cultura, apontando-a para um trabalho significativo e uma aprendizagem constante. Olhando para o futuro, pelo menos 45% daquilo que as pessoas são pagas para fazer está aberto à automatização. Se acontecer, esta mudança irá convergir com a cultura dominante dos millennials no local de trabalho.

Um estudo da Fidelity mostrou que os millennials aceitariam um corte de 6500 euros nos rendimentos se pudessem encontrar um trabalho mais intencional ou uma cultura mais adequada noutro local.

Certas tarefas menos gratificantes terão de ser automatizadas porque as pessoas já não as querem fazer. As organizações terão, contudo, de agir com cuidado. Se a automatização é imposta do topo sem ter em conta os colaboradores, pode seguir-se rebelião e sabotagem.

Para que o staff consiga crescer à medida que surgem carreiras anteriormente inimagináveis, as organizações precisam de começar a transformar as suas culturas de forma a facilitarem uma aprendizagem contínua. Devem apoiar habilmente novos talentos (principalmente se a IA dominar o trabalho que tradicionalmente é feito pelos menos experientes) e encorajar o talento mais experiente a estar pronto a absorver um fluxo constante de informações novas.

As organizações terão a oportunidade de actualizarem e optimizarem a sua abordagem e estratégia em relação ao design com um certo grau de automatização.

Mark Rolston, fundador da Argodesign, identificou um “ponto intermédio” que poderia beneficiar de algum tipo de intervenção de Inteligência Artificial entre «o puramente estético e o puramente técnico – alterando incrementalmente o design, optimizando a largura das colunas e fazendo experiências com esquemas de cores».

A disciplina de design deve desenvolver-se ainda mais como resposta à necessidade crescente de combinar um design centrado em humanos com a aprendizagem das máquinas. As empresas que oferecem serviços de design já estão a mover-se nessa direcção. Recentemente, os nossos colegas da Accenture lançaram o Accenture Applied Intelligence, e a IDEO adquiriu a Datascope, uma empresa de ciência de dados.

Nascerá a necessidade de uma nova geração de produtos e serviços automatizados que aproveitam os pontos fortes de uma colaboração eficaz entre humanos e máquinas – isto depende de combinar com sucesso um design centrado nos humanos e a aprendizagem das máquinas.

Estes novos produtos e serviços serão fundamentais para resolver problemas que hoje podemos apenas imaginar, como a melhor forma de colocar visibilidade nas conversas entre máquinas para que as pessoas compreendam como estas comunicam entre si.

Artigo publicado na Revista Executive Digest n.º 147 de Junho de 2018.

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