…porque não têm de mudar

Como especialista em processos de mudança empresarial, perguntam-me muitas vezes: “Porque é que as pessoas resistem à mudança?” Porque é que, mesmo entendendo conceptualmente que uma determinada mudança é necessária, ainda assim as pessoas têm dificuldade em implementá-la?”

Confesso a minha perplexidade perante a dúvida. Acho que quem pergunta espera de mim uma sistematização de forças a favor e contra a mudança, uma análise psicológica de apetências pessoais pela novidade ou, no mínimo, uma lista de boas práticas sobre o tema.

Qualquer uma dessas alternativas seria uma resposta séria, reveladora de conhecimento profundo, como compete a um especialista. Mas a realidade é bem mais prosaica do que isso e eu prefiro respeitá-la. Daí que a resposta habitualmente surpreenda o meu interlocutor.

A razão pela qual as pessoas não mudam é… porque não têm de mudar. Se a mudança for opcional, então só muda quem quer. E quem quer mudar? Como as mudanças acarretam custos e perdas que levam tempo a recuperar, apenas as pessoas que se sentem forçadas pelas circunstâncias a mudar aceitam fazê-lo por iniciativa própria. Ou seja, quem acha que tem de mudar ou se sente forçado a fazê-lo, muda. Para os outros – a grande maioria – a opcionalidade equivale a imobilidade.

Há muitas razões para se ficar imóvel enquanto o mundo muda à nossa volta, mas podemos enquadrálas em três grandes factores: a incompetência, a complacência e a estupidez.

As pessoas incompetentes não sabem como lidar com a mudança. Qualquer proposta de alteração de procedimentos ou metodologias que se lhes faça encontra uma resistência: parece sempre abstracta, teórica, impossível. A sua incompetência impede-as de operacionalizar estratégias em acções. Tudo o que não sabem implementar é apodado de irrealista. Mas porque não é útil assumir isto, nem para si próprio, o incompetente revolta-se contra a mudança e boicota-a.

As pessoas complacentes não entendem a necessidade da mudança. Dentro de um ego insuflado não há espaço para melhorias. Pelo menos enquanto o balofo não esvaziar. Assim, qualquer proposta de alterar as suas práticas esbarra contra uma certeza absoluta: “isso é desnecessário.” O valor que estas pessoas se atribuem depende da convicção de estarem sempre certas. Admitir a necessidade de mudar seria assumir implicitamente que algumas das coisas que hoje fazem “não estão certas.” Por isso, opõem-se à mudança.

As pessoas estúpidas não vêem a mudança. A sua parca inteligência não lhes permite identificar as razões por trás do que acontece ao seu redor. Ignoram todos os sinais de que o seu mundo está a ruir, de que as estratégias que utilizam estão a deixar de funcionar e de que os pressupostos basilares da sua actividade se alteraram. “Pressupostos de quê?” – perguntam elas. “O que é isso?”

Só as pessoas preparadas aproveitam a mudança espontaneamente. Quanto mais inovadora for a mudança proposta, menos estruturada está a sua implementação. Logo, mais necessária é a competência individual para adaptar a estratégia inicial aos imprevistos do terreno. Isto só pode ser feito por pessoas competentes e com as atitudes adequadas: flexibilidade, auto-crítica, orientação para a aprendizagem e melhoria contínua.

Para os projectos de mudança terem sucesso devem incluir formação, comunicação especializada regular e obrigação de implementação. Só assim se garante que as pessoas que não querem mudar sejam preparadas e levadas a fazê-lo. O resto não passa de boas intenções, de que estão as empresas cheias.

Por Ricardo Vargas

 

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