Uma leda e entorpecida estagnação (I)

Por Paulo Carmona

Cada vez que vou a Madrid saio envergonhado com o dinamismo daquelas gentes que faz de Lisboa uma pobre e simpática cidade de província… e se pensássemos nisso e nos deixássemos de tretas?

A actual solução governativa comemorou um ano e, pelos vistos, de boa saúde. Uma solução estranha para quem se lembra da Alameda em 1975 ou do 25 de Novembro, mas o mundo evoluiu… E, se virmos bem, era natural ser tentada. António Costa, ao perder as eleições no dia 4 de Outubro, ou tentava uma solução deste género, baseada numa aliança mais contra a continuidade do Governo anterior do que preocupada em estabelecer bases para um projecto comum de sociedade, ou estaria fora do Governo e com a carreira tremida. Mais valia tentar uma solução destas, e com alguma sorte da economia, dos mercados e de algum milagre, ficar quatro anos.

Porque se falamos em milagres na economia Portugal é um país abençoado. Só isso ajuda a entender porque não estamos pior dada a reconhecida má gestão económica dos Governos.

Mesmo no pico da crise, com a troika a acossar-nos, o BCE fez o que tinha de ser feito para salvar o euro e desatou a comprar dívida, baixando as taxas e facilitando em muito o nosso processo de ajustamento.

Recentemente, por circunstâncias várias, nomeadamente o autoproclamado Exército Islâmico, o turismo disparou dando uma ajuda inexcedível às nossas contas do crescimento. Se juntarmos a isso uma queda do petróleo, que aumentou o rendimento disponível dos portugueses, uma queda do euro que facilitou as nossas exportações e a reconhecida flexibilidade e dinâmica dos nossos empresários, podemos dar graças por não estarmos muito pior.

Portugal parece que tem uma mão divina que nos ampara. Não será por acaso que Nossa Senhora parece que escolheu aparecer por aqui. As nossas crises e recessões são quantitativamente mais suaves que muitos dos nossos parceiros europeus, mas quando é para recuperar padecemos de constrangimentos e restrições à confiança e ao investimento que nos cortam o potencial, e isto é de nossa única e exclusiva responsabilidade. Os outros crescem e nós não, porque?

Veja-se a vizinha Espanha, e é impossível os espanhóis serem melhores que nós… pelo menos foi isso que aprendi na escola. A Economia caiu, recuperou e hoje cresce de uma forma pujante e nós… ficamos a ver.

Em 1970 tinham 90% do nosso PIB per capita. Em 1980 já estavam em 110% e hoje estão perto dos 145%. Ou seja, são mais ricos do que nós e continuam a enriquecer mais… É verdade que eles tiveram Felipe Gonzalez e José Maria Aznar, nós não tivemos a mesma sorte, mas não dá para copiar nem que seja só um bocadinho? Cada vez que vou a Madrid saio envergonhado com o dinamismo daquelas gentes que faz de Lisboa uma pobre e simpática cidade de província…

Gostava muito que os portugueses também enriquecessem.

E se pensássemos nisso e nos deixássemos de tretas?

Este artigo foi publicado na edição de Dezembro da revista Executive Digest.

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