O Estado Social e os seus inimigos

paulocarmona1Conheci já muita gente, mas nunca gente tão má que se dedique a acordar de manhã apenas com o propósito de destruir o Estado Social e os direitos dos trabalhadores. Quem serão esses inimigos?

Não serão com certeza os fascistas do Estado Novo. Afinal a sua concepção de estado protector, e as suas propostas de modelo económico condicionado e corporativo, têm muito que ver com a definição de Estado Social presente na nossa Constituição. O terrível rótulo de neo-liberal, ou o que isso queira dizer, não se conseguirá nunca aplicar a Salazar.

Não serão com certeza os capitalistas portugueses, pois aqueles que existem têm pouco poder e muita dívida. Pelo contrário, quase todos os empresários portugueses convivem muito bem com um Estado Social e Grande que lhes pode dar as rendas, PPPs ou garantias de mercado que sempre desejaram.

E os capitalistas estrangeiros? Esses têm tantas oportunidades de investimento num mundo em crescimento que perdem pouco tempo com os nossos problemas e a nossa irrelevância global. Se nós não resolvemos os nossos problemas e criarmos condições para eles investirem e criarem emprego em Portugal, passam imediatamente para o país seguinte na lista.

Paradoxalmente são os trabalhadores do sector público de transportes, sempre muito activos em paralisar o país em alturas de greves gerais, que mais pugnam pelos seus direitos, porventura diríamos, os mais ameaçados. Porque o “patrão” que os oprime é o mesmo Estado Social que juram defender e cujos recursos procuram captar.

Mas então o que ameaça e destrói o Estado Social? Curiosamente o próprio Estado Social com o seu tamanho desajustado ao nível de riqueza e possibilidades de financiamento e o seu crescimento desenfreado e acrítico.

Mesmo com uma Constituição programática, sonhadora e carregada de direitos positivos, cuja aplicação integral há muito que não é considerada por impossibilidade real, a sua revisão é tabu e contribui para o mito do Estado Social. Que Estado maravilhoso pode assegurar o emprego, a habitação, a educação, a saúde e um salário digno? Um Estado com o qual todos sonhamos, mas que não existe nem nunca existiu.

Depois de 30 anos a distribuir tudo a todos, o que tinha e o que não tinha, o choque da realidade chegou. E brutal. De um momento para o outro, por impossibilidade financeira e com a bancarrota próxima, o Estado retirou muitos desses direitos incluindo os mais básicos como as remunerações completas aos funcionários públicos e pensionistas.

É tempo de largar os bloqueios do que gostaríamos de ter e ver o que realmente podemos ter. Com o nosso nível de riqueza quais os recursos que podem e devem ser afectos aos direitos sociais dos portugueses? Que Estado Social temos condições de ter? O que se pode garantir socialmente aos portugueses com uma dose de eficiência que o Estado nem sempre consegue, por despesismo, clientelismo e outros ismos? O debate segue dentro de momentos.

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