Asfixiar o Estado até quando?

Por Paulo Carmona

Há uma famosa anedota de um agricultor avarento que reduzia todos os dias a palha ao burro até que, um dia, o burro morreu. O agricultor ficou surpreendido e dizia: “agora que o burro já tinha aprendido a trabalhar sem comer é que morreu…”

Isto a propósito das falências do Estado na protecção dos seus cidadãos face a um fogo mortífero, com a ampla descoordenação e falhas dos sistemas de combate às chamas e sua prevenção. E depois na segurança de quartéis, munições e ridicularização das Forças Armadas. Uma autorização para construção de uma cerca, de 300 mil euros, que demorou 73 dias porque teve de ir à aprovação do ministro, dadas as cativações assumidas sobre despesas já de si cortadas ao limite nos anos da Troika e de Vítor Gaspar. Ou seja, todos os anos retiram palha ao burro, qualquer dia…

Hoje é nos fogos e na segurança de instalações militares. E se amanhã for nas infra-estruturas, transportes ou saúde? Esperemos todos que não e que esta forma de obsessão pelo défice, pelo esmagamento das despesas e do investimento público não definhe a prestação de serviços essenciais da Administração Pública. Claro que este Governo não tem “culpa” directa sobre o que está a acontecer, tal como parte da “culpa” do crescimento também reside em decisões políticas anteriores, como por exemplo as muito contestadas alterações à legislação laboral, conforme reconheceu a OCDE.

E este Governo, apesar das habituais narrativas, sensatamente não reverteu a legislação laboral, antes a trocou por benesses e progressões na carreira de profissionais da função pública na área da saúde, educação e transportes, questões até mais do agrado dos sindicatos e do eleitorado comunista e bloquista.

Dados os ciclos eleitorais, os governos colhem os frutos ou as tempestades que anteriores governos semearam. Claro que podem inverter os rumos, mas as decisões raramente têm consequências imediatas, a não ser o corte cego de despesas no ano orçamental que bem compõe as contas, tanto do agrado deste e do anterior governo dado o estado de emergência financeira. Contudo, os efeitos secundários podem ser dramáticos.

Não tendo “a culpa”, apenas responsabilidade política, como Jorge Coelho assumiu em Entre-os-Rios, era escusado todas estas reacções atarantadas que revelam uma preocupante falta de estadistas. Até Capoulas Santos, que nos últimos 20 anos foi apenas ministro da Agricultura e eurodeputado, afirma em Março querer plantar mais eucaliptos e dinamizar a fileira da celulose, um dos maiores exportadores, e depois do incêndio em Junho, talvez até muito mais de pinheiros, vem afirmar peremptoriamente que não autorizará mais nenhuma plantação de eucalipto, conforme exigiu histrionicamente o Bloco de Esquerda. Assim funciona a geringonça e se detectam as “profundas” convicções dos responsáveis políticos em relação a um sector determinante para a Economia Portuguesa. Estamos entendidos…

Este artigo foi publicado na edição de Julho de 2017 da revista Executive Digest.

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