A “bolha” imobiliária

Segundo dados publicados pelo jornal Dia 15, Portugal era o 16.º país mais rico da UE em 2006 e será o 22.º (ou 5.º mais pobre) em 2021. O nosso rendimento era 74% dum espanhol e hoje é 65%, depois de termos partilhado climas, culturas e crises. Essa é a verdadeira causa dos nossos problemas.

Por Paulo Carmona

Uma dúvida tem assaltado os pensamentos de muitas empresas e individuais. Será que estamos perante uma bolha imobiliária. Ou seja, até que ponto os activos estão demasiado caros face ao seu preço real, qual é esse preço real, e se caírem, quando acontecerá isso.

Porto, Lisboa, costa alentejana e Algarve. Todas estas regiões têm sido alvo de compra por parte de estrangeiros para efeito de deslocalização para Portugal, ao abrigo duma política agressiva de off-shore fiscal para reformados europeus e visto dourado, com atribuição de residência em Portugal/espaço Schengen a investidores que invistam no imobiliário português.

Com o sucesso destas políticas veio o reverso da moeda. Com muita procura de estrangeiros atrás de poucas casas à venda, veio a normal subida dos preços para alegria de muitos proprietários de casas, entrada de capitais, mas desgraça de muitos inquilinos ou jovens à procura de primeira habitação. Para a explosão ser maior, tivemos um súbito influxo de turistas, mercê de boas políticas de divulgação do País, que fez disparar a procura de locais de pernoita, incluindo nos populares sites de aluguer temporário de apartamentos a turistas, e que compôs o rendimento de muitas famílias. A compra e remodelação de casas, com saída de inquilinos, para esse tipo de aluguer fez aumentar ainda mais os preços num mercado já bastante aquecido com as políticas públicas mencionadas.

E quais as consequências práticas? Lisboa e Porto têm visto o seu parque habitacional ser reabilitado. Onde antes tínhamos bairros com casas a cair de podre por falta de manutenção, com risco de vida dos inquilinos, temos hoje prédios bem arranjados e comprados por estrangeiros e outros transformados em estaleiros de obras.

E são estrangeiros que compram e não os portugueses, porquê? Pelo resultado das políticas referidas e porque os portugueses têm vindo a empobrecer face aos restantes europeus desde o início do século. Segundo dados publicados pelo jornal Dia 15, Portugal era o 16º país mais rico da UE em 2006 e será o 22.º (ou 5.º mais pobre) em 2021. O nosso rendimento era 74% dum espanhol e hoje é 65%, depois de termos partilhado climas, culturas e crises. Essa é a verdadeira causa dos nossos problemas. E com uma tão grande dívida ao exterior, resta-nos vender activos para pagá-la. Assim, o mercado ajusta com a mudança dos portugueses menos abastados do centro para a periferia das grandes cidades, forçados pelo preço, ou quando perceberem que podem tirar vantagens financeiras que o possam compensar. É um ajustamento em baixa, mercê do nosso empobrecimento relativo, que não pára.

Quanto à subida do preço das casas, há sinais de estagnação, ou até de algum retrocesso, mais pelo aumento da oferta, estimulada pelos preços elevados. Claro que o Estado poderia assumir um papel importante na estabilização do mercado. Com 4500 imóveis devolutos no País, e com serviços públicos desnecessariamente no centro de Lisboa ou Porto, é um Estado imóvel, pouco reactivo e que poderia acalmar a bolha. Dali não virá ajuda, apenas palavras e muita hipocrisia em negócios privados.

Este artigo foi publicado na edição de Agosto de 2018 da Executive Digest.

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